sábado, 30 de maio de 2009

Belchior x Olavo Bilac

Gosto muito de música e literatura, e me interesso muito pela intertextualidade entre composições. Ainda criança, ouvia em um cd de minha mãe, uma composição de Belchior titulada "Divina Comédia Humana". E algum tempo depois, tive contato com a obra do poeta parnasiano Olavo Bilac, autor de "Via Láctea", poema que faz parte de seu livro "Poesias", publicado em 1888. Apesar de ainda não compreender muito bem o que Belchior queria dizer com "quero gozar no teu céu, pode ser no seu inferno", me chamava muito atenção o fato de ele incluir ao final da música, um pedaço do poema de Bilac: "Ora direis ouvir estrelas, de certo perdeste o senso e eu vos direi, no entanto". E, unindo o trecho de Belchior com a inserção de Bilac, justamente no final, torna-se inteligível a junção da letra da música com os versos do poemma...
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VIA LÁCTEA
Olavo Bilac
"Ora (direis) ouvir estrelas! Certo

Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...

E conversamos toda a noite, enquanto
A via láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?"

E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas."
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DIVINA COMÉDIA HUMANA
Belchior
Estava mais angustiado
Que um goleiro na hora do gol
Quando você entrou em mim
Como um Sol no quintal

Aí um analista amigo meu disse
Que desse jeito não vou ser feliz direito
Porque o amor é uma coisa mais profunda
Que um encontro casual

Aí um analista amigo meu disse
Que desse jeito não vou viver satisfeito
Porque o amor é uma coisa mais profunda
Que um transa sensual

Deixando a profundidade de lado
Eu quero é ficar colado à pele dela noite e dia
Fazendo tudo e de novo, e dizendo sim à paixão
Morando na filosofia
Quero gozar no seu céu, pode ser
Pode ser no seu inferno
Viver a divina comédia humana
Onde nada é eterno

Ora, direis, ouvir estrelas,
Certo, perdeste o senso
Eu vos direi, no entanto,
Enquanto houver espaço, corpo, tempo
E algum modo de dizer não, eu canto
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E o melhor de tudo é que tive a honra de conhecer Belchior em 2004, ele esteve aqui, na porta da minha casa...

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