sábado, 20 de junho de 2009

Ataulpho Alves X Vander Lee

Ataulpho Alves foi um grande sambista da década de 40. Sua obra está entre as mais extensas entre compositores brasileiros e foi considerado por muitos críticos musicais o melhor compositor de sambas de todos os tempos.
Dentre suas famosas canções, está "O bonde de São Januário", composta a pedido de Getúlio Vargas, na época do Estado Novo. A canção foi encomendada a Ataulpho com o intuito de conter a malandragem e incentivar o trabalho, pregando uma espécia de "ética proletária" (não sei se este termo é o mais apropriado, mas foi o melhor que encontrei...rs). Ataulpho uniu-se a Wilson Batista para compor o samba que, apesar de positivo, foi vetado pelo DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda), órgão do governo que fiscalizava objetos veiculados na imprensa falada e escrita. A vedação se deu porque Wilson substituiu a palavra "operário" por "otário". Furioso, Vargas pediu para que Ataulpho modificasse o texto da canção, que ficou assim:


O BONDE DE SÃO JANUÁRIO
Wilson Batista - Ataulpho Alves

Quem trabalha
É quem tem razão
Eu digo
E não tenho medo
De errar
Quem trabalha...
O Bonde de São Januário

Leva mais um operário
Sou eu
Que vou trabalhar
O Bonde São Januário...
Antigamente

Eu não tinha juízo
Mas hoje
Eu penso melhor
No futuro
Graças a Deus
Sou feliz
Vivo muito bem
A boemia
Não dá camisa
A ninguém
Passe bem!

Vander Lee está entre os grandes compositores da MPB na atualidade. Já o citei em outras postagens, gosto muito dele. Iniciou sua carreira em meados dos anos 80, ainda tocando em barzinhos da região motropolitana de Belo Horizonte. Ganhou notoridade ao ter sua música "Onde Deus possa me ouvir" gravada por Gal Costa (apesar de que na voz dele é bem melhor...rs) e fez parceria com grandes nomes da música brasileira, como Zeca Baleiro, Elza Soares, Leila Pinheiro, dentre outros.
"No balanço do balaio" é uma das canções de seu primeiro cd, lançado, se não me engano, em 1997:


NO BALANÇO DO BALAIO

Vander Lee

No balanço do balaio
Saculejo, saculejo, saculejo
Aí me dá um sono

Eu pego meu balaio lá pra Zona Norte

Com mais uma hora estou chegando lá
É o meu único meio de transporte
Com sorte eu consigo até sentar
É gente que entra, é sinal, é sinal
É malandro na porta, que se segura
Que sai sem pagar, na cara-de-pau
Moleque na traseira que dependura

Balaio que arranca mas não vai

Diga lá, seu motô, quer que eu vá a pé?
Ê Balaio, que balança mas não cai
Não me empurra! Não pisa no meu pé!

Ah, seria tão bom…

Se eu morasse no São Bento, na Savassi, no Anchieta ou no Sion

O bacana das duas canções é que ambas versam sobre o mesmo assunto. Ataulpho Alves e Vander Lee descrevem o trajeto ao trabalho, mas com elementos que tornam possível perceber que foram compostas em épocas diferentes. "Bonde de São Januário", escrita em tempos de ditadura militar, tem um texto mais formal. "No balanço do balaio" é descontraída e, de certa forma, denuncia o precário sistema de transporte coletivo que o cidadão brasileiro utiliza pra ir trabalhar (eu que o diga...rs).

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